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REDE
BRASILEIRA DE EDUCAO EM DIREITOS HUMANOS |
PESSOA,
SOCIEDADE E HUMANOS DIREITOS p4s1l
283sq
Dalmo de Abreu Dallari
A sociedade humana
um conjunto de pessoas ligadas pela necessidade de se ajudarem umas
s outras, a fim de que possam garantir a continuidade da vida e
satisfazer seus interesses e desejos.
Sem a vida em sociedade, as pessoas
no conseguiriam sobreviver, pois o ser humano, durante muito tempo,
necessita de outros para conseguir alimentao e abrigo. E no mundo
moderno, com a grande maioria das pessoas morando nas cidades, com
hbitos que tornam necessrios muitos bens produzidos pela indstria,
no h quem no necessite de outros muitas vezes por dia.
Mas as necessidades dos seres humanos
no so apenas de ordem material, como os alimentos, roupa, moradia,
meios de transporte e os cuidados de sade. Elas so tambm de ordem
espiritual e psicolgica. Toda pessoa humana necessita de afeto,
precisa amar e sentir-se amada, quer sempre que algum lhe d
ateno e que todos a respeitem. Alm disso, todo ser humano tem suas
crenas, tem sua f em alguma coisa, que a base de suas
esperanas.
Os seres humanos no vivem juntos,
no vivem em sociedade apenas porque escolhem esse modo de vida, mas
porque a vida em sociedade uma necessidade da natureza humana. Assim,
por exemplo, se dependesse apenas de vontade, seria possvel uma pessoa
muito rica isolar-se em algum lugar, onde tivesse armazenado grande
quantidade de alimentos. Mas essa pessoa estaria, em pouco tempo,
sentindo falta de companhia, sofrendo a tristeza da solido, precisando
de algum com quem falar e trocar idias, necessitadas de dar e
receber afeto. E muito provavelmente ficaria louca se continuasse
sozinha por muito tempo.
Mas, justamente porque vivendo em
sociedade que a pessoa humana pode satisfazer suas necessidades,
preciso que a sociedade seja organizada de tal modo que sirva,
realmente, para esse fim. E no basta que a vida social permita apenas
a satisfao de algumas necessidades da pessoa humana ou de todas as
necessidades de apenas algumas pessoas. A sociedade organizada com
justia aquela em que os benefcios e encargos so repartidos
igualmente entre todos.
Para que essa repartio se faa com
justia, preciso que todos procurem conhecer seus direitos e exijam
que eles sejam respeitados, como tambm devem conhecer e cumprir seus
deveres e suas responsabilidades sociais.
DIREITO
IGUALDADE DE OPORTUNIDADES
5x81s
H quase 2 mil anos o Cristianismo vem
pregando que os seres humanos so todos iguais. A Declarao
Universal dos Direitos Humanos tambm afirma isso, dizendo no seu
prembulo que todos os seres humanos nascem iguais em dignidade e
direitos. Em quase todas as Constituies do mundo est escrito que
todos so iguais perante lei.
Pois apesar de todas essas
afirmaes, repetidas e reforadas por muitos filsofos e pensadores
polticos, o que se v na realidade que as pessoas so tratadas
como desiguais. As prprias leis garantem a desigualdade, e nos
costumes de quase todos os povos encontra-se muitas prticas baseadas
na desigualdade, podendo-se ver claramente que em grande nmero de
situaes as pessoas so tratadas como iguais.
Essas leis e esses costumes j se
acham to arraigados que quase todas as pessoas consideram normal o
tratamento desigual. E existem mesmo pessoas que falam e escrevem que
todos so iguais e no percebem que, na prtica, agem como se os
seres humanos nascessem e continuassem desiguais.
Para perceber e corrigir essas
contradies preciso, em primeiro lugar, compreender o que
significa afirmar que todos nascem iguais. evidente que as pessoas
nascem fisicamente desiguais, sendo diferentes nas feies, no
tamanho, na cor da pele e em inmeras outras caractersticas fsicas.
No , portanto, essa igualdade que se est afirmando.
Quando se diz que todos os seres
humanos nascem iguais, o que se est afirmando que nenhum nasce
valendo mais do que o outro. Como seres humanos, todos so iguais, no
importando onde nasam, quem sejam seus pais, a raa e que pertenam
ou a cor de sua pele.
Se todos nascem iguais, valendo a mesma
coisa, como se explica que uns j nasam muito ricos, tendo toda a
assistncia, proteo e conforto, enquanto outros nascem miserveis,
mal podendo sobreviver, sem cuidados mdicos e sem a certeza de que
tero os prprios alimentos indispensveis vida? Como justificar
essa diferena de situaes e de possibilidades, se no momento em que
nascem as crianas so iguais e no existe como saber o que cada uma
far de bem ou de mal, de til, ou de intil, durante sua vida?
A est, justamente, a principal
diferenciao estabelecida pela sociedade contra a natureza,
acarretando conseqncias para a vida inteira das pessoas. Os seres
humanos nascem iguais, mas a sociedade os trata, desde o comeo, como
se fossem diferentes, dando muito mais oportunidades a uns do que a
outros. E isso apoiado pelas leis e pelos costumes, que agravam ainda
mais o tratamento desigual e criam grande nmero de barreiras para que
aquele que foi tratado como inferior desde o nascimento consiga uma
situao melhor dentro da sociedade.
Assim, por exemplo, um menino que nasce
numa favela igual ao que nasce numa famlia rica e vale o mesmo que
este, mas dificilmente o favelado conseguir boa alimentao e boas
escolas e desde cedo ser tratado como um marginal. Essa
discriminao ir acompanh-lo pela vida inteira. Fica bem evidente,
portanto, que um menino nascido numa favela no tem o direito
igualdade de oportunidades, embora a prpria lei diga que todos so
iguais.
Mas no s por nascer na pobreza
que muitas pessoas so tratadas como inferiores s outras. negado o
direito igualdade em todos os casos de discriminao social e de
preconceito de raa, de cor e de sexo. Quando algum impedido,
direta ou disfaradamente, de se hospedar num hotel, de permanecer num
restaurante ou de freqentar um clube por causa de sua cor ou de sua
raa, est sendo negado o direito igualdade. O mesmo se d quando,
antes mesmo de conhecer uma pessoa, de verificar seus costumes e
comprovar sua capacidade, outras pessoas julgam que ela ser
mal-educada, ignorante ou incompetente, baseando-se apenas na raa, na
cor e no sexo da pessoa discriminada.
Assim, pois, todas as vezes em que uma
pessoa vtima de preconceitos, ocorre a negao do direito
igualdade. por isso que a Organizao das Naes Unidas condena
os preconceitos, e em muitos pases existem leis proibindo que as
pessoas sejam tratadas como inferiores por motivo de raa, de cor ou de
sexo. Essas leis procuram garantir para todas as pessoas de que todos
nascem iguais e so naturalmente iguais.
Mas a experincia tem demonstrado que
adianta muito pouco a lei dizer que todos so iguais e proibir que umas
pessoas sejam tratadas como inferiores s outras se no for garantida
a igualdade de oportunidades para todos desde o nascimento. Com efeito,
quando uns nascem ricos e outros pobres, as oportunidades so muito
diferentes e por isso as pessoas se tornam socialmente diferentes,
desprezando-se a igualdade natural.
No basta afirmar que todas as pessoas
so iguais por natureza. Para que essa afirmao tenha resultados
prticos, preciso que a sociedade seja organizada de tal modo que
ningum seja tratado como superior ou inferior desde o instante do
nascimento. preciso assegurar a todos, de maneira igual, a
oportunidade de viver com sua famlia, de ir escola, de ter boa
alimentao, de receber cuidados de sade, de escolher um trabalho
digno, de ter o aos bens e servios, de participar da vida
pblica e de gozar do respeito dos semelhantes.
Todas as pessoas nascem iguais em
dignidade, e nada justifica que no sejam dados os mesmos direitos a
todos. Todos tm igual direito ao respeito das outras pessoas, e nada
justifica que no tenham, desde o comeo, as mesmas oportunidades.
Texto
extrado do livro: DIREITOS HUMANOS NO BRASIL: Conferncia para
educadores.
Organizado
por Helosa Occhiuse, Judith Patarra e Paola Cohen.
Seo Brasileira de Anistia
Internacional
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